terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Nutrigenômica



O genótipo, que representa todos os genes de um indivíduo, mais a ação do meio ambiente, é o fenótipo. O meio pode mudar ao longo do tempo, assim, a sua ação sobre os genes também muda, resultando numa alteração do fenótipo, conhecido como a variabilidade genotípica e fenotípica.

O impacto ambiental pode ser externo e/ou interno; o efeito externo é determinado pela temperatura, quantidade de luz, umidade, quantidade de gases de efeito estufa, pressão atmosférica, entre outros. O efeito interno é determinado principalmente pela dieta. A dieta tem efeitos diferentes em diferentes indivíduos e estudo destes efeitos conduziu ao desenvolvimento da ciência como a genômica, o que levou o "genoma" que posteriormente levou à "transcriptoma", os "proteômica" e "metabolômica" e que, juntos, aplicado a nutrição é se tornou conhecida por "nutrigenômica".

A Nutrigenômica envolve a compreensão de como os componentes alimentares afetam a expressão de genes, ou seja, que genes são induzidos ou reprimidos frente para um determinado nutriente. A Nutrigenética é a compreensão de como genes respondem frente uma dieta especial, tendo em conta a variação da população e, especialmente individual. Neste ponto, levando em conta o papel que o polimorfismo de nucleotídeo único e os efeitos epigenéticos em segundo lugar, o que certamente influenciará em todos os níveis, ou seja, transcriptômica, proteômica e metabolômica.

A Nutrigenômica nos permitir uma melhor compreensão de como a nutrição influência as vias metabólicas e o controle homeostático. Macronutrientes, micronutrientes e componentes bioativos que não são nutrientes (flavonoides, polifenois, antioxidantes), podem participar em associação com fatores endócrinos e parácrinos na regulação da expressão gênica em resposta a mudanças na quantidade e/ou tipo de nutrientes da dieta consumida com efeitos benéficos ou prejudiciais para à saúde.

Nutrigenômica e Obesidade

Em relação aos nutrientes regularem a expressão gênica, os ácidos graxos podem exercer um efeito de regulação através do NF-kB. O EPA modula diferencialmente a adipogênese e reduz o tamanho da gota de gordura nos adipócitos, devido à diminuição da expressão de PPARγ e um aumento da expressão do gene da enzima lipase, o que acelera mobilização de triglicerídeos de adipócitos.

A deposição de gordura é acompanhada pelo aumento de biomarcadores para a inflamação e estresse oxidativo, que por sua vez podem afetar a função do tecido adiposo. Biomarcadores associados à obesidade podem ser úteis para a identificação precoce de indivíduos suscetíveis a essa doença, bem como predizer o risco do desenvolvimento de doenças cardiovasculares e diabetes.

Estes biomarcadores interagem com fatores de risco que podem se desenvolver mais tarde, levando a manifestações de doenças cardiovasculares. Assim, os biomarcadores envolvidos na obesidade e que podem atuar como fator de risco para doenças cardiovasculares são ECA, PADR, CRP, C3, GPx, HDL, IL-6, IL-18 LDL, oxLDL, PAI-1, PPAR-γ, O TNF-α , VCAM.

Nutrigenômica e Desordens cardiovasculares

Estudos epidemiológicos e prospectivos apontam os nutrientes e compostos bioativos como importantes fatores modificáveis determinantes de doenças crônicas, como as doenças cardiovasculares. Dentre estes nutrientes e compostos bioativos moduladores do metabolismo lipídico destacam-se os ácidos graxos essenciais e os polifenois.

Inúmeros trabalhos de pesquisa a respeito da interação entre ácidos graxos e genes avaliam a família de PPAR (PPARα, PPARβ e PPARγ), os quais são ativados por ácidos graxos de cadeia longa, com destaque para PPARα. A PPARα regula genes envolvidos no metabolismo de lipídeos e glicose, bem como no desencadeamento da aterosclerose, e são responsivos a ácidos graxos de cadeia longa poli-insaturados, de modo especial aos ácidos graxos essenciais.

Pesquisas envolvendo a interação entre genes e doenças cardiovasculares são cada vez mais frequentes. Estas pesquisas significam um potencial para a redução do risco de desordem cardiovascular em nível do genótipo individual. Entretanto é essencial mais pesquisas para entender as limitações e superar os desafios da complexidade das interações entre nutrientes e genes.

Nutrigenômica e Diabetes

Os polimorfismos genéticos associados ao diabetes DMT2 incluem genes que participam dos metabolismos bioquímicos, regulatórios e sinais de transdução do DNA, sendo capazes de produzir fenótipos associados com essa doença. A via que liga a obesidade e resistência à insulina com a síndrome metabólica e DMT2 representa um fenótipo progressivo.

A presença do polimorfismo de TNF-α -308 G/A foram associadas a uma resposta mais favorável ao metabolismo da glicose após intervenção no estilo de vida (consultas médicas periódicas, dieta saudável, atividade física e redução estresse psicossocial) apesar de mudar de maneira não significativa a adiposidade. Neste caso, a presença de polimorfismo produz uma resposta positiva ao indivíduo.

A literatura descreve que certas variantes do gene da proteína associada à obesidade e ao tecido adiposo (FTO) parecem estar correlacionadas com a obesidade em seres humanos. Um estudo, publicado em 2009, avaliando a variante FTO rs9939609 e dieta de baixo valor energético variando o conteúdo de carboidratos e lipídeos mostraram que embora não tenham encontrado nenhum efeito da variante de FTO rs9939609 na perda de peso, nem nas diferentes combinações da dieta, os indivíduos com a variante FTO rs9939609 portadores do alelo A e dieta LF parecem ter um menor risco de abandono da intervenção.

Nutrigenômica e Câncer

Câncer é uma doença de natureza multifatorial e complexa. Pesquisas sobre os efeitos dos componentes alimentares e seus efeitos sobre o câncer tem mostrado que estes podem potencialmente fornecer proteção em várias fases durante o desenvolvimento do câncer.

Os efeitos da nutrição sobre a metilação do DNA e do papel dos eventos epigenéticos na prevenção do câncer foram destacados na revisão de Manson (2005). Estudos de prevenção do câncer têm mostrado que todas as principais vias de sinalização desreguladas em diferentes tipos de câncer são afetadas por nutrientes. As vias estudadas incluem: metabolismo carcinogênico, reparo de DNA, proliferação celular/ apoptose, diferenciação, inflamação, desequilíbrio da razão oxidante/antioxidante e angiogênese.

Até o momento, mais de 1000 diferentes tipos de fitoquímicos foram identificados com atividades de prevenção de câncer. Com base em estudos epidemiológicos, as dietas ricas em frutas e vegetais podem oferecer proteção contra o desenvolvimento de câncer.

Componentes bioativos presentes nestes alimentos podem prevenir a carcinogênese por vários mecanismos, tais como bloqueio de ativação metabólica e do aumento de desintoxicação. Estudos in vitro e modelos pré-clínicos têm demonstrado que muitos constituintes de alimentos de origem vegetal como os flavonoides, quercetina, rutina e genisteína, fenois, curcumina, epigalocatequina-3-galato e resveratrol, isotiocianatos, compostos de alil, enxofre, indois e selênio, podem modular enzimas de desintoxicação. 



Conclui-se, portanto, que componentes alimentares bioativos podem afetar eventos celulares e moleculares que são importantes na prevenção do câncer. Em um futuro próximo os estudos de componentes dietéticos, utilizando sistemas modelo de tecido / célula podem ajudar a ter uma melhor compreensão das inter-relações entre nutrigenética, epigenômica nutricional, transcriptômica nutricional, proteômica e metabolômica. Como o avanço no campo da nutrição molecular e a melhor compreensão das funções do genoma humano, haverá uma maior compreensão de como os alimentos e seus componentes influenciam o câncer.

As informações contidas neste blog, não devem ser substituídas por atendimento presencial aos profissionais da área de saúde, como médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e etc. e sim, utilizadas única e exclusivamente, para seu conhecimento.

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